terça-feira, 24 de novembro de 2015

domingo, 15 de novembro de 2015

Moção de rejeição do Governo PAF

MOÇÃO DE REJEIÇÃO N.º _/XIII
Exposição de motivos 
I
Entre 2011 e 2015, o governo da XII legislatura usou o programa de ajustamento negociado com a troika como pretexto para implementar uma agenda radical e experimentalista, que foi muito além do que o programa previa, não por necessidade, mas por uma consciente e deliberada opção ideológica.
O corte nos rendimentos de trabalhadores e pensionistas, a degradação dos serviços públicos, o desinvestimento na Educação e Saúde públicas, os cortes na ciência, a desvalorização salarial, a promoção do trabalho precário e o ataque à Segurança Social tiveram como principal objetivo, não a sustentabilidade das contas públicas, mas sim a alteração da relação de forças em Portugal, contra os interesses dos trabalhadores, das famílias, das classes medias e dos mais pobres.
A política seguida gerou a maior compressão na procura interna alguma vez regista no nosso país. As pequenas e médias empresas sofreram as consequências: milhares delas enfrentaram o encerramento, enquanto outras sobreviveram com dificuldade comprimindo o emprego e o investimento. 
As consequências desta governação estão hoje à vista. Entre 2011 e 2015, a riqueza gerada no Pais recuou mais de uma década, o investimento recuou para níveis de meados dos anos 80, perderam-se mais de 200 mil empregos e emigraram mais de
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350 mil pessoas. Reduziu-se o valor pago pelas prestações sociais, bem como o número dos seus beneficiários. Aumentou o risco de pobreza, em particular nas crianças, aumentaram as taxas de retenção e desistência no ensino básico. Intensificaram-se as desigualdades. As famílias viram os seus rendimentos descer e sentiram muito mais dificuldades em pagar os empréstimos contraídos, perdendo muitas a sua própria habitação, ao mesmo tempo que sofreram a maior carga fiscal de sempre.
Portugal vive ainda mergulhado numa crise social e económica prolongada que exige uma resposta política capaz de inverter a estratégia de desvalorização salarial e social, de degradação das condições de vida das famílias e de desinvestimento nos serviços públicos que marcou a governação da legislatura anterior.
II
Os resultados das eleições legislativas realizadas no passado dia 4 de outubro de 2015 significaram uma derrota das políticas de austeridade conduzidas pela coligação do PSD-CDS ao longo dos últimos quatro anos e da estratégia de empobrecimento adotada. 
A maioria dos eleitores recusou expressivamente o programa político que pretendia prosseguir o caminho de risco para o nosso modelo social e que arriscava entrar, uma vez mais, em confronto com o texto da Constituição em áreas determinantes para o nosso futuro coletivo. A essa clara maioria de votos nos partidos que pretendem virar a página e mudar o rumo da governação do país corresponde também uma clara maioria parlamentar de sentido divergente com
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aquele que se encontra espelhado no Programa do XX Governo Constitucional submetido a apreciação da Assembleia da República. 
Longe de constituir uma base para uma mudança de orientações políticas ou o reconhecimento do juízo de censura maioritária colhido nas urnas, o Programa que foi dado à Assembleia da República apreciar insiste numa trajetória de desinvestimento nos serviços públicos.
Onde é necessário um sistema de proteção social robusto, universal e tendencialmente gratuito, continuamos a encontrar uma opção por modelos assentes numa leitura meramente assistencialista, tão ineficientes quanto negadores dos verdadeiros direitos sociais que lhe deveriam estar na base, e uma negação do estado de degradação em que se encontra o Sistema Nacional de Saúde. 
Onde é necessário uma política de valorização do conhecimento e da investigação científica, continuamos a deparar-nos com um texto que não consegue inverter a perda de qualidade da escola pública, que canaliza recursos para o setor privado e que se demonstra incapaz de chamar de volta as gerações qualificadas que o país foi perdendo nos últimos anos.
Onde é necessário uma política de modernização da economia que aposte na produção de conhecimento e na sua transferência para as nossas empresas, aquilo a que assistimos é à insistência numa política em que o principal instrumento de recuperação da competitividade perdida continua a ser a compressão salarial.
Onde se impõe a dignificação dos rendimentos das famílias, capaz de lhes permitir responder às exigências do dia-a-dia e, reflexamente, oferecer novo dinamismo à atividade económica, continuamos a encontrar uma insistência no modelo que nos
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tem empurrado para um aumento do fosso das desigualdades e dificultado a vida às empresas. 
Onde se justificava a adoção de medidas destinadas a combater a precariedade laboral e a dignificar o trabalho, encontramos o silêncio ou a prossecução do caminho inverso. 
Analisado o Programa do XX Governo Constitucional, o Partido Socialista constata que traduz, uma vez mais, sem qualquer inflexão, as opções políticas dos últimos 4 anos, confirmando a impossibilidade de construção dialogante de qualquer modificação substancial de rumo.
Neste quadro parlamentar resultante do ato eleitoral, confrontando-se com a referida vontade dos partidos políticos que suportam o XX Governo Constitucional em prosseguir o caminho rejeitado pela maioria dos cidadãos eleitores, e tendo em conta as profundas dificuldades que Portugal atravessa e que decorrem de uma crise social e económica prolongada o Partido Socialista, o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista Português e o Partido Ecologista “Os Verdes”, decidiram conferir tradução política à vontade de mudança expressa pelos eleitores, empenhando-se na construção de uma solução governativa distinta, capaz de reconciliar o Governo com a Constituição e com o País.
Desta convergência entre os referidos partidos, resultou um acordo que cria uma maioria parlamentar, capaz de sustentar a formação e a ação de um Governo comprometido com a mudança reclamada nas urnas, trilhando um caminho claramente distinto daquele que é preconizado no Programa do XX Governo Constitucional.
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Neste cenário, importa pois assegurar uma convergência capaz de virar a página das políticas de austeridade que traduziram a estratégia de empobrecimento seguida pelos partidos da direita, salvaguardando a defesa da Constituição da República e apontando para prioridades consentâneas com as necessidades das pessoas, das famílias e das empresas, gizadas em torno de quatro ideias fundamentais, diametralmente opostas ao que o Programa do XX Governo Constitucional nos apresenta:
a) Defender o Estado Social e os serviços públicos, com destaque para a segurança social, a educação e a saúde, promovendo um combate determinado à pobreza e às desigualdades sociais e económicas;
b) Conduzir uma estratégia de consolidação das contas públicas assente no crescimento e no emprego, no aumento do rendimento das famílias e na criação de condições para o investimento público e privado;
c) Promover um novo modelo de progresso e desenvolvimento para Portugal, que aposte na valorização dos salários e na luta contra a precariedade; relance o investimento na educação, na cultura e na ciência; e devolva à sociedade portuguesa a confiança e a esperança no futuro.
d) Valorizar a participação dos cidadãos, a descentralização politica e as autonomias insulares.
III
Neste contexto, concluído o processo de discussão e negociações com o BE, o PCP e o PEV, estão criadas as condições para a formação de um Governo de iniciativa do Partido Socialista, sustentado por uma maioria parlamentar, garantindo ao País um Governo estável, responsável, coerente e duradouro, na perspetiva de uma legislatura. Perante as posições acordadas e publicamente assumidas pelo PS, BE, PCP e PEV está garantida:
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a) A formação e viabilização parlamentar de um Governo do PS, com o Programa de Governo aprovado na Comissão Nacional do PS de 7 de Novembro de 2015, que inclui as alterações resultantes das negociações com os partidos da esquerda parlamentar e que respeita os compromissos nacionais e internacionais do Estado Português;
b) A existência de condições de estabilidade na perspetiva de Legislatura com a garantia de não aprovação de eventuais moções de rejeição ou censura da iniciativa do PSD e do CDS;
c) A existência de condições de governabilidade com a apreciação conjunta dos instrumentos fundamentais de governação, designadamente os Orçamentos do Estado.
Este compromisso entre as referidas forças políticas permite corresponder simultaneamente a três desideratos: dá sentido à vontade expressa nas urnas de mudança de rumo político do País, assegura o compromisso do Partido Socialista de apenas apresentar uma moção de rejeição se estivesse em condições de formar um Governo alternativo e dá tradução ao repto lançado pelo Presidente da República de construção de uma maioria parlamentar de apoio a qualquer futuro Governo enquanto condição de estabilidade.
A rejeição do Programa do XX Governo Constitucional que através desta moção se coloca à consideração da Assembleia da República permitirá abrir o caminho a uma solução governativa alternativa.
IV
Assim, confrontado, por um lado, com a proposta de Programa de Governo apresentado pelo XX Governo Constitucional e suportada pelos dois partidos da coligação de direita, agora sem maioria parlamentar, insistindo no aprofundamento da sua estratégia de radicalização programática e ideológica para
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os próximos quatro anos; e face à existência, por outro lado, de um projeto político alternativo e credível, liderado pelo Partido Socialista e apoiado pela maioria absoluta dos Deputados à Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, em coerência com o seu compromisso eleitoral, inviabilizará a prossecução da estratégia para a economia e para a sociedade portuguesa apresentada pelo PSD e pelo CDS-PP neste debate. 
Nestes termos, ao abrigo do disposto n.º 3 do artigo 192.º da Constituição da República Portuguesa e das demais normas constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista propõe que seja rejeitado o Programa do Governo apresentado à Assembleia da República pelo XX Governo Constitucional.
Palácio de São Bento, 10 de novembro de 2015
Os Deputados e Deputadas do Partido Socialista